Autora: Gina Marques

Professora Adjunta, Escola Superior de Saúde de Santarém, Instituto Politécnico de Santarém
Membro Integrado do Centro de Investigação em Qualidade de Vida, na área científica Saúde Individual e Comunitária

 

Considerações iniciais

O envelhecimento progressivo e continuado das populações é assunto de relevo no século XXI, pelas implicações nos diferentes setores da vida individual e comunitária, e igualmente pelos desafios que coloca à necessária adequação dos cuidados de saúde e de enfermagem, tendo em conta as necessidades específicas das pessoas idosas, num futuro próximo a maioria dos cidadãos pertencerá à fase de vida adulto e idoso, e ainda porque à perspetiva atual sobre o envelhecimento é nuclear o Envelhecimento Ativo e Saudável, que visa melhorar o bem-estar das pessoas idosas, o que requer a adequação dos determinantes de saúde individual e comunitária sensíveis e centrados nas necessidades que as próprias pessoas idosas identifiquem.

Neste artigo, olha-se à perspetiva de que prevenir as doenças associadas à idade e aos estilos de vida, previne uma grande percentagem do mal maior que causam ao ser humano, que é da dependência. Porque, a saúde e o bem-estar ou a ausência dos mesmos para as pessoas idosas, envolvem determinantes associados a aspetos subjetivos da vida, mobilizam-se os resultados dos relatos de pessoas com mais de oitenta anos, que a viver a velhice relataram as experiências vividas com significado de perturbação do seu bem-estar na fase de vida idoso, e que fizeram emergir um modelo de cuidados essencialmente humanista às pessoas idosas.

 

Num futuro próximo parte significativa da população será idosa

Nas últimas cinco décadas, a esperança de vida à nascença aumentou cerca de 10 anos, tanto para os homens como para as mulheres. Em Portugal entre 1960 e 2013 o número de filhos por mulher em idade fértil, diminuiu de 3,2 para 1,2 (Eurostat, 2019), atualmente 22,1% da população portuguesa tem 65 ou mais anos de idade, Portugal é o quarto país da União Europeia e o quinto da OCDE com maior percentagem de pessoas idosas, cerca de 26% da população, prevendo-se que até 2050 esta percentagem suba para os 40%, sendo potenciado pelo crescimento da emigração e a redução da imigração (Pordata, 2019).

O envelhecimento tem impactos significativos nas sociedades que representam desafios e oportunidades (EU, 2021),  a perspetiva e o discurso do envelhecimento populacional associado sobretudo a um “desastre iminente” causando potencial desacelaramento económico, tende a ser rebatido por  análises económicas que mostram que os custos associados ao envelhecimento das sociedades são administráveis, e existem contrapartidas e benefícios económicos, sociais e ambientais associados a populações substancialmente menores apontando-se, uma necessária reorientação das prioridades económicas, nomeadamente a transição de uma economia de mercado, para uma economia de bem-estar, que valorize os atos humanos e que garantiria a qualidade de vida dos humanos; a proteção do mundo ambiental e os motores de toda a atividade económica; e contribuiria para reconhecer o verdadeiro valor do que é humano nomeadamente das pessoas mais velhas (Götmark, Cafaro & O’Sullivan, 2018). O estudo relacionado com o envelhecimento da população portuguesa, enquanto fonte de crescimento da despesa pública, e consequentemente da dívida pública, revela que o envelhecimento não é a principal fonte de crescimento da despesa em saúde, bem como não é causa de tensão entre gerações (Barros, 2019).

No entanto, o envelhecimento das populações ocorreu em poucas décadas, e de forma particularmente rápida e de forma mesmo muito rápida em alguns países, sem haver uma transição ou adaptação por parte das diferentes estruturas sociais, como os serviços de saúde, sociais e outros, para responder às necessidades específicas das pessoas mais velhas. Atualmente vivem-se mais anos, mas as pessoas mais velhas estão também expostas a maiores vulnerabilidades decorrentes de aspetos individuais e contextuais, e muitas pessoas no mundo não têm acesso à vivência dos anos acrescentados nas últimas décadas ao ciclo de vida humana, com qualidade e dignidade.

A ocorrência de fenómenos sociais como a perda de valores, a ostracização e discriminação com base na idade face às pessoas mais velhas, refletem-se em aspetos, como lhes ser cada vez mais vedada a possibilidade de participação ativa nas comunidades, na família e até nas decisões acerca de si próprios. Estes estereótipos tendem a afetar a autoestima e a identidade destas pessoas, resultando em desvantagens concretas em diferentes níveis, como seja no acesso a bens, serviços e cuidados de saúde e que comprometem a expectativa de bem-estar e qualidade de vida em idades mais avançadas (OMS, 2015; DGS, 2017; Moreira, 2020).

Por conseguinte, as Nações Unidas e a Organização Mundial da Saúde ao longo das últimas décadas têm desenvolvido e promovido políticas públicas e de saúde, tendo em vista uma conceção transformadora face à forma como a sociedade e as pessoas pensam, sentem e agem em relação à idade; ao envelhecimento e às pessoas idosas, à sua saúde e bem-estar, que nas últimas décadas tem conhecido vários sequenciais, nomeadamente o Envelhecimento Ativo (OMS, 2002); o Envelhecimento Saudável (OMS, 2015); e a atual década, a Década do Envelhecimento Saudável (OMS, 2019).

Nesse sentido, na atualidade quando o assunto é o envelhecimento, o elemento nuclear e orientador, é o paradigma do Envelhecimento Ativo e Saudável nomeadamente, no atual Desenvolvimento Sustentável e a Década do Envelhecimento Saudável, lançada pelas Nações Unidas (EU, 2021) e liderada pela Organização Mundial da Saúde, que congrega e desafia os diferentes setores da saúde, sociais, económicos e outros, no sentido de que as pessoas idosas em todo o mundo, sem exceção tenham condições pessoais e ambientais para viver o máximo de anos com a melhor qualidade de vida.

O desafio da Década do Envelhecimento Saudável visa, melhorar a vida das pessoas idosas numa ação concertada dos diferentes sistemas sociais, da saúde e económicos com vista à mudança de paradigma face à forma como as pessoas pensam, sentem e agem em relação à idade e ao envelhecimento, ou seja, combater o preconceito em relação às pessoas mais velhas; visa igualmente a organização das comunidades de forma a proporcionar ambientes amigáveis para as pessoas mais velhas e a estimular e a facilitar que com as suas habilidades e capacidades participem e contribuam para as suas comunidades e sociedade; e desafia à mudança de modelo de prestação de cuidados de saúde e sociais essencialmente preventivos ao invés do atual modelo curativo, e por isso integrados e centrados nas pessoas, e cuidados de saúde primários que atendam às necessidades específicas das pessoas idosas; e prover acesso a cuidados de longa duração a todos os que deles necessitem (Officer & Manandhar, 2019).

A mudança de um modelo de saúde curativo e biomédico como é o atual, para um modelo preventivo é amplamente justificado e necessário tendo em conta que na maioria dos países europeus, são identificadas sobretudo três categorias da população acima dos 60 anos: as pessoas com perda de autonomia (dependentes) devido a doença incapacitante, cerca de 8%; pessoas autónomas, mas frágeis, cerca de 15%; e pessoas idosas robustas, com boa saúde, ainda que por vezes sejam portadoras de doenças crónicas, mais de três quartos (Forette, 2019).

O desafio atual passa por aumentar o grupo das pessoas que vivem de forma independente, apostando na prevenção relativamente a três alvos: as chamadas doenças associadas à idade, a fragilidade e a inatividade (estilo de vida sedentário) (Forette, 2019).

As doenças associadas à idade, na sua maioria causadoras de perda de autonomia, têm fatores de risco modificáveis e por isso, sensíveis à prevenção, tais como: as doenças cardiovasculares, AVC´s, demências (doença de Alzheimer), cancro, osteoartrite e osteoporose, fraturas ósseas, distúrbios da visão e audição, depressão, distúrbios nutricionais e metabólicos, obesidade, diabetes tipo II.

Outras doenças menos evitáveis, como a doença de Alzheimer, e ainda que existam grandes avanços no seu controlo, pois a prevalência parece diminuir graças ao melhor controle dos fatores de risco cardiovasculares; ao aumento do nível de educação; e maior e mais prolongada estimulação cognitiva (Forette, 2019).

Assim, para a prevenção de doenças associadas ao envelhecimento são os estilos de vida modificáveis o foco, com base numa cultura de saúde e consciência preventiva como a alimentação saudável; a realização de atividade física moderada e prolongada; ter atividade intelectual de modo particular, relacionada com a atividade profissional; praticar atividade de lazer; ter compromissos e responsabilidades pessoais. A grande dificuldade em relação à prevenção consiste na necessária mudança no estilo de vida que costuma ser difícil de concretizar, mas é reconhecido que os agentes da prevenção mais eficazes são: as escolas começando o mais cedo possível, o ambiente profissional, as universidades seniores e os médicos de família (Forette, 2019).

O segundo alvo de prevenção, é a fragilidade, constituindo-se num estado de vulnerabilidade ao estresse, secundário a deficiências múltiplas dos sistemas fisiológicos, cujos critérios são: fadiga, perda muscular (sarcopenia), perda de peso, redução da velocidade de caminhada e diminuição da atividade física. A fragilidade é um importante fator de risco para a hospitalização e morte. É reversível, mas aumenta com a idade: em 15% em média, vai de 3 a 4% dos 65 aos 74 anos, para 25% ou mais a partir dos 85 anos (Forette, 2019).

O terceiro alvo de prevenção extremamente importante é a inatividade, que compromete seriamente a saúde e a longevidade.  O índice de mortalidade padrão para homens entre os 35 e os 80 anos, e a categoria social, este índice aumenta das categorias mais privilegiadas para as mais modestas, mas é mais elevada entre os inativos. Pelo contrário, todos os tipos de atividades, física, intelectuais, de lazer, sobretudo a atividade profissional, bem como as interações sociais, reduzem a perda de autonomia e a mortalidade, aumentam a expectativa de vida, e reduzem a demência. A prevenção passa pela manutenção e estímulo de funções cognitivas. Prolongar a atividade profissional parece ser particularmente benéfico para a saúde cognitiva (Dufouil, 2014), atrasar a idade da reforma em um ano está associado a uma diminuição de 3,1% de risco de demência (Forette, 2019).

Hammerman-Rosenberb (2005), mostra que independentemente de estado de saúde inicial, trabalhar aos 70 está associado a boa saúde, independência e longevidade. Por exemplo a Suécia (78%) entendeu que os idosos não devem ser excluídos do mercado de trabalho, quer por razões de equilíbrio financeiro, quer por motivos de saúde e integração das pessoas idosas, mas este benefício não foi verificado, para trabalhos fisicamente exigentes, e que não oferecem estímulo intelectual. Da mesma forma, também, qualquer atividade física, independentemente da intensidade ou a frequência melhora as funções cerebrais (Forrete, 2019). A atividade, as relações sociais, e atenção a outros promovem o otimismo. O otimismo é excelente para o saúde e longevidade (Giltay et al., 2006) a mortalidade cardiovascular pode reduzir em 40% em otimistas por comparação com pessimistas. O que significa as vantagens que poderão advir da integração das pessoas idosas nas sociedades.

O desenvolvimento da prevenção em todas as idades das doenças vinculadas ao envelhecimento, pode reduzir a percentagem de pessoas com perda de autonomia e é  igualmente necessário melhorar os cuidados às pessoas idosas, nomeadamente através do desenvolvimento de pesquisas sobre a longevidade pois, conduz necessariamente, à tomada de medidas para adequação dos cenários de vida destas pessoas, às suas reais necessidades, sentidas e, desejavelmente expressas e não a considerações de qualquer outra natureza.

 

Acesso ao significado das experiências vividas por pessoas idosas

O estudo e compreensão dos fenómenos humanos subjetivos como a vivência da velhice pela perspetiva das próprias pessoas idosas, e o significado atribuído às experiências vividas, é igualmente importante a par dos aspetos fisiológicos para a adequação dos determinantes individuais e comunitárias, no desenvolvimento de ambientes amigáveis num quadro de envelhecimento saudável e ativo. É importante porque, as pessoas têm valores e pontos de vista subjetivos, e entrar no seu mundo interior pela compreensão dos significados das suas experiências subjetivas, contribui para identificar e atender às suas necessidades individuais ou comunitárias.

Na investigação realizada no âmbito do doutoramento em enfermagem, estudou-se o significado das experiências vividas por pessoas idosas, com mais de 80 anos, ouvindo-as no seu contexto de vida, que pela escuta dos relatos das suas experiências vividas e interpretação das mesmas, num enfoque fenomenológico (Paterson & Zderad, 2008; Swanson, 2000), compreenderam-se experiências que na fase de vida idoso, contribuem para ausência de bem-estar existencial.

As pessoas relataram que na fase de vida idoso, a falta, a ausência ou precariedade das relações afetivas estabelecidas ao longo vida com outras pessoas, que as próprias elegem, quase sempre como sendo a família, nomeadamente os filhos, leva a uma existência da velhice deficiente, gera sofrimento e ausência de bem-estar. Os afetos têm um significado profundo para continuar a viver humanamente depois dos oitenta anos.

As pessoas que perderam o seu cônjuge que vivem um luto duradouro, vivem em sofrimento permanente, e o mundo dos seres humanos e das coisas e torna-se para estas sem importância, não encontrando apego a algo ou alguém, revelam sentirem um véu permanente sobre a sua existência, que as impede de viver no mundo e com os outros em bem-estar.

Para as pessoas com mais de oitenta anos a capacidade de realizarem as ações inerentes ao seu autocuidado e de gerirem a sua vida, associa-se à preservação, e à continuidade de serem e existirem de forma integral, a perda da autonomia tem um significado de incompletude enquanto pessoas e também de encaminhamento para a finitude da vida em sofrimento.

Ser dependente de outrem, tem para as pessoas idosas mais relação com o sentido de velhice do que possuir idade cronológica avançada.  A incerteza face à perda de autonomia é uma experiência dominante para as pessoas com mais de oitenta anos, e que espelha medo de desamparo e incapacidade de gerir a sua própria vida, mas também incerteza face ao que esperar do futuro. A dependência no autocuidado com maior ou menor intervenção de outrem, significa para a pessoa com mais de 80 anos sempre uma ingerência, uma invasão de uma área sagrada para si enquanto pessoa.

Viver em conflitos familiares depois dos oitenta anos, nomeadamente com os filhos, gera sofrimento e constitui-se na vivência de uma vulnerabilidade nesta fase de vida.

Viver só e sentir-se em solidão ou viver acompanhado com outras pessoas, e sentir-se igualmente em solidão, por falta de afetos gera sofrimento, porque o ser humano não é solitário, tem uma insuperável dependência de relação aos outros, sobretudo numa interdependência matricial de afetos para as pessoas idosas. A perda de laços sociais devido problemas de saúde dos próprios ou dos seus cônjuges, enviuvar, perder a convivência familiar e social resulta em formas de se sentirem solitários e em solidão.

A falta de valores universais, como a não saudação no relacionamento social, a falta de honradez nos contratos sociais, a falta do sentido de partilha e do sacrificar-se de algum modo para bem de outrem; a não correspondência de níveis elevados de formação em melhores relações humanas, contribui para ausência de bem-estar existencial entre seres humanos na fase de vida depois dos oitenta anos.

O conhecimento do significado das experiências vividas pelas pessoas idosas revelam e apontam constrangimentos ao seu bem-estar na fase de vida idoso, que devem ser tidos em conta quando se pretende contribuir para um envelhecimento ativo e saudável, sobretudo porque na conceção das futuras políticas públicas, as estratégias de avaliação e identificação dessas necessidades requerem sobretudo abordagens personalizadas e centradas nas pessoas, para que as respostas sejam efetivas, atendendo à sua dignidade e independência (UNECE, 2018). E o bem-estar, sendo um conceito eminentemente subjetivo, não deixa de ser mensurável (Leuschner, 2019).

 

Ênfase na dimensão humana nas experiências de sofrimento das pessoas idosas

Assim, pelo significado das experiências vivida pelas pessoas idosas, emerge e sedimenta uma necessária conceção de cuidados de saúde e sociais a estas pessoas, centrada na experiência pessoal vivida e na interpretação que as mesmas fazem do que vivenciam, e na qual se sintam envolvidas e contribuam de forma significativa para a sua saúde e bem-estar.

Tais aspetos, propõem uma base de compreensão do existir humano que visa o esclarecimento das experiências específicas e respostas humanas às situações de vida e de saúde vividas de forma singular por cada pessoa idosa, e que encontra uma estrutura de realização, de se poder tornar manifesto pela presença terapêutica de enfermagem.

Ainda que se reconheça dificuldade em explicar o significado de presença (Paterson & Zderad, 2008; Stanley, 2002), porque compreende o ir além de uma simples ação comportamental de enfermagem, é uma escolha e uma forma de estar que um enfermeiro faz, de é dom do “eu” que só pode ser dado livremente, invocado ou evocado.

Neste entendimento a interação entre enfermeiro e a pessoa idosa, o enfermeiro tem a perspetiva de valorizar a pessoa ao potenciar o seu melhor bem-estar e de procurar com as pessoas o significado da vida e dos seus fenómenos, como sejam o sofrimento. A combinação entre o fazer e o ser afirma-se como forma de uma resposta humana às situações igualmente humanas vivenciadas pelas pessoas, constituindo-se assim um “modo de cuidar inter-humano” específico da enfermagem (Paterson & Zderad, 2008).

No “processo de cuidados de enfermagem” às pessoas idosas o centro de interesse são as pessoas (Amendoeira, 2000, p. 9), essa base de reflexão é fundamental ao profissional de saúde para ajudar a pessoa a ser ela própria a dar significado(s) à sua situação, a si mesmo, e à sua vida, para tal o profissional “escuta”, e está atento aquilo que muitas vezes não é dito, por palavras. E desse modo age enquanto perito “a partir de uma compreensão profunda da situação global” (Benner, 2001, p. 58). Neste entendimento, as tais competências suportam uma prática de enfermagem avançada, e traduzem-se num aprofundamento relacional, no entendimento que cuidar (com desvelo, compaixão e solicitude) vai para além de prestar cuidados enquanto mero fazer técnico e rotineiro, comporta uma atitude também ela aprendida, treinada, investigável e validável, assim passível de se sintetizar em evidência científica de enfermagem (Queirós, 2017).

No cuidado às pessoas idosas valoriza-se a posse e o desenvolvimento de competências técnicas instrumentais, no entanto o enfermeiro de prática avançada, ou seja, humanística consegue uma prática relacional e cuidativa, atuando com elevado desempenho no âmbito de um cuidado integral de enfermagem.

Quando a perspetiva do enfermeiro se concentra, se foca na compreensão da pessoa idosa enquanto ser humano, ao invés de se focar apenas nos aspetos da idade e nos eventuais constrangimentos decorrentes da idade, possibilita explorar e encaminhar-se a uma perspetiva mais global e integrada da pessoa enquanto Ser (Paterson & Zderad, 2008) e a não estar com a pessoa de forma rotineira e mecanizada (Doona et al., 1997).

Para as pessoas idosas, muitas vezes a vivenciar um padrão de morbilidade e comorbilidades, e mesmo que a pessoa se encontre em processo de doença, deste tipo de encontro entre profissional e o cliente tende a resultar sobretudo conforto (Paterson & Zderad, 2008).

Sabendo-se o papel crítico que as redes de apoio, como sejam os conviventes significativos, e sobretudo as relações familiares próximas têm para as pessoas no combate à vulnerabilidade e na promoção da sua saúde (Reblin & Uchino, 2008), para as pessoas idosas este aspeto é ainda mais premente e crucial, dado que a rede social tende a restringir-se ao núcleo familiar, à medida que as pessoas envelhecem (Litwin & Stoeckel, 2013).

Um ambiente terapêutico nos cuidados às pessoas idosas é assegurado na medida em que qualquer ato, por mais simples e mundano que aparente ser, preserva sempre a integridade da pessoa (honrando a sua dignidade e tendo a possibilidade de tomar decisões sobre seus próprios cuidados), gera uma atmosfera de puro cuidado (Swanson, 2000).

Na fase de vida idoso e por vezes de forma abrupta, ocorrem situações que levam a mudanças significativas na vida das pessoas, tais coma a ocorrência de doença, a perda de um ente significativo como seja o cônjuge, que leve ao luto mais ou menos prolongado ou mesmo viver enlutado (Berg et al., 2009), a perda da independência no autocuidado (UNECE, 2018), a ida para lar de idosos (Rossen, 2010) são exemplos de experiências que consoante o processo da experiência, a pessoa pode ficar mais vulnerável, pois está associado a eventos que exigem a definição ou redefinição do reportório de papéis pessoais e ou familiares (Meleis, 2007).  Fundamenta a importância de identificar, reconhecer e sobretudo acompanhar as pessoas idosas, na vivência de transições para que ocorram de forma bem-sucedida com o menor impacto negativo na sua saúde e no seu bem-estar (Meleis, 2010).

 

Considerações finais

O slogan do Envelhecimento Ativo, encerra desafios e traz reflexões sobre a forma como as pessoas usufruem da longevidade. A promoção da Saúde e os estilos de vida saudável ao longo da vida, potencialmente e contribuem para uma maior esperança de vida saudável e tem influência positiva na manutenção da autonomia, o que reitera e valoriza a importância da área de intervenção autónoma de enfermagem, no âmbito da literacia em saúde ao longo do ciclo vital, e que deve animar os profissionais na capacitação das pessoas, famílias e comunidades de modo a que possam envelhecer e a usufruir da velhice com mais qualidade.

Dos relatos das pessoas mais idosas emergem experiências vividas com significado de ausência de bem-estar, como solidão decorrente de viver só, ou sem afeto; a perda do companheiro por viuvez; a vivência de conflitos familiares sobretudo com os filhos, a perda de autonomia no seu autocuidado, significa que muitas vezes a maior fonte das necessidades das pessoas idosas não são cuidados técnicos e científicos, mas outro tipo de cuidados centrados essencialmente de presença e envolvimento reciproco numa dimensão humana e humanística.

 

Artigo publicado na Newsletter de dezembro de 2021 do CIEQV